O ingrediente secreto, ou entrar numa casa de strip às escuras são quase a mesma coisa.

É normal ouvir-se dizer que a ignorância é uma bênção. Até certo ponto concordo. Por outro, na demanda por uma alimentação de qualidade e mais saudável fui-me transformando numa espécie de rótulóinspetor. Por exemplo, ao comparar o penne feito pela Barilla na América, com o que compramos na europa, encontrei uma enorme discrepância de ingredientes, num produto que supostamente é o mesmo. A quantidade de substâncias desconhecidas que o penne “Americano” leva, e qual a verdadeira necessidade de elas lá estarem é um verdadeiro mistério da criação. Os americanos têm uma entidade reguladora que é a FDA, Food and Drug Administration, que apesar do nome pomposo, parece ter a mesma credibilidade que um cartel de droga em Bogotá. Vejamos, por exemplo, o que para a FDA pode caber dentro do conceito de sabor natural, o castoreum. O castoreum é extraído, a partir de uma gândula do ânus seco e macerado de um castor, e suas secreções, claro. Pouco importa, se é macho, ou fêmea, desde que tenha o trânsito intestinal regularizado, suponho. Porque não as secreções de um rato? Ou as de uma massagista tailandesa? Que testes específicos foram conduzidos, aos rabos das mais diferentes espécies, pela sagaz pessoa que descobriu que as secreções anais de um castor seriam melhores que as secreções anais de qualquer outro bicho? E já agora, há fotos ou vídeos no Youtube? Mas o porquê, é mesmo a pergunta que prevalece e com acentuado crescimento de relevância, quando descobrimos que para além de ser usado na industria cosmética, é também usado em gelados de baunilha e xaropes de concentrados de fruta. O que estava a correr tão mal com o gelado de sabor a baunilha que o castoreum foi resolver? Porém, olhando para tudo com algum distanciamento, qual o problema com o castoreum, que é usado desde o tempo dos romanos, fazendo um percurso cronológico de mezinha mística, a tratamento medicinal no século 18, para finalmente acabar por ser usado na industria alimentar, há 80 anos atrás? Não estaremos nós a ser preconceituosos com as secreções anais dos castores? Aparentemente, o seu consumo não tem qualquer malefício para a nossa saúde, embora também não perceba se faz algum bem, então e afinal qual é o mal? Tenho dois pontos de vista. 1. Preconceito, preconceito, preconceito. Há uma data de gente que nunca mais vai comer gelado baunilha. Ótimo. Se calhar até estavam a precisar de cortar em alguma coisa e o gelado de baunilha pode ser um bom começo. O grande problema, é que não vão saber se o seu gelado tem ou não castoreum, porque o rótulo vai dizer simplesmente: Natural Flavoring ou Flavor. É aqui que nasce o segundo ponto de vista: 2. Porque é que um organismo como a FDA deixa os barões da industria alimentar esconderem isto, e muitas outras coisas, dentro do conceito alargado de ingrediente ou sabor natural? Podia, quando muito, enganar um amigo meu e dar-lhe castoreum no gelado de baunilha, por pirraça e gozo. Mas ele está no seu pleno de direito de não querer comprar um gelado com aquele ingrediente. Este direito é vetado porque valores mais altos se levantam, num assunto, que apesar de não cheirar a essência de flato de castor, cheira a grande ambiguidade. O Castoreum, não faz mal, ninguém sabe muito bem o que acrescenta, e ninguém quer que se saiba que está dentro do gelado de baunilha. Bendita ignorância.

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