Cem maneiras de criar um menu de degustação com produtos dos Açores. E o Ljubomir conseguiu falhar em quase todas.

Estive aqui às voltas para perceber como poderia não falar dos jantares do 10 Fest e cheguei à conclusão que a tarefa que se me apresentava iria ser muito difícil. Como poderia eu renegar a escrever sobre o maior evento gastronómico de sempre realizado nos Açores? Ainda por cima quando sempre estive na linha da frente na crítica à ausência de eventos deste tipo e restaurantes com um nível mínimo de qualidade. Fosse ela no serviço, fosse ela na criatividade e inovação. Começo por arrumar os restos de ontem em Tupperwares, distinguindo a organização do 10 Fest, o serviço do 10 Fest e a cozinha do 10 Fest. Da organização já falei e entreguei os louros, méritos e a última cuequinha que usei antes de perder a virgindade. Do serviço, também é rápido falar. Com um impressionante carrossel de empregados de mesa, que só vi paralelo em Hospital Road, Gordon Ramsay, 3 estrelas Michelin, é quase impossível algo falhar, pois a rede é tão grande e com um malha microscópica. Arrasta tudo. Ou melhor, serve tudo o que há a servir e mais alguma coisinha. E assim chegamos à próxima estação: Cozinha. Neste caso, a cozinha emprestada ao Chef Ljubomir Stanisic, por quem tenho uma enorme simpatia, não se vá pensar que o que vou escrever é falta de afecto. O 10 Fest propõe aos chef’s um briefing que tem tanto de simples como complexo e que passa pela tentativa de introduzir produtos regionais na conceptualização da ementa. Ljubomir, que até acredito que já saiba ler razoavelmente em português, não ignorou o briefing. Conseguiu ir mais longe. Não conceptualizou, ignorou o briefing e foi preguiçoso ao presentear-nos com uma cópia ligeiramente adaptada do seu menu de Verão do Cem Maneiras. Sendo que quando falamos em cópia adaptada, entramos num campo perigoso. Muito perigoso. Porque é que um prato que foi criado para ser servido com viera é servido com atum dos Açores? São dois ingredientes distintos e que me podem levar a pensar que, eventualmente, substituo os dois por uma salsicha, ou qualquer outra coisa, e a coisa, mais coisa, menos coisa, coisa bem. Isto mostra fragilidades na concepção quer do Menu de Verão original, que mesmo assim não é tão original, porque já o provei em pleno inverno, no Cem Maneiras, alguns pratos deste suposto novo menu de Verão. E agora voltei a provar os mesmos pratos na cópia adaptada para o 10 Fest. (Quanto mais penso nisso, mais perigoso fica. Então o que tem aquele menu de Verão? Enfim.) Cá vamos nós, ponto a ponto, garfada a garfada. 1. O estendal é um clássico, podemos até considerar uma bandeira. Original e diferente para quem nunca viu ou comeu. (Estaria ele a pensar que ninguém tinha visto ou provado a sua comida? Quase de certeza que não, pois sei que algumas pessoas que lá estavam, também estiverem no Cem e ele também o sabia). 2. Sardinha no pão, este peixe que tanto aparece na costa açoriana, estava excelente, logo da primeira vez que o comi, em pleno inverno, no Bairro Alto. Ainda me recordo da cara e entusiasmo do Ljubomir ao apresentar-nos o prato e a dizer: come-se com as mãos. Foi este o ponto que me fez recordar de uma série de coisas, pois ontem ao ser-nos apresentado o prato da sardinha disseram o mesmo. 3. Carpaccio, do qual não tenho grande vontade de falar, mas ali no Colégio 27, corre-lhes melhor. Seja tecnicamente, seja a nível de perfil de sabor. 4. Vieira corada com salada de algas, cogumelos e caldo asiático. Peço desculpa não foi viera, foi atum. (Um copy/paste propositado do seu menu de degustação de Verão) 5. No cherne com trigo encontrei uma linha que separou os dois menus, pena apresentar problemas confecção no ponto de cozedura do cherne. Mas não vou ser comichoso, tentem tirar 60 pratos ao mesmo tempo de uma cozinha e depois falamos. 6. O leitão, que no meu caso era quase uma bola de gordura e os dois menus de degustação voltam a confundir-se. Peço desculpa pela bola de gordura, pode ter sido um azar só meu. 7. Espuma de queijo com goiaba e nougat de medronho, outro copy/paste que fiz do menu de Verão. Mas sai o medronho e entra uma bebida espirituosa regional e está tudo dito. Não duvido que o Chef Ljubomir tenha dado o litro, nesta espécie de missa de corpo presente, mas a cabeça, essa estava noutro lugar.

Comentários

  1. ao ver no programa do Bourdain o 100 Maneiras a "vender" coração de cavalo, fígado de touro e mioleira de porco como "very traditional" passei a acreditar zero no Chef Ljubomir. são azares :) bjs, sheila

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  2. Pois. Devo confessar que comi quase sempre bem quando fui ao Cem Maneiras, fosse no Bairro ou no Bistro. Porém, depois de reflectir sobre o seu percurso recente fico com a sensação de Chef da Moda. E ele está a aproveitar. No fundo, no fundo, acho que faz bem. As ondas em Portugal são pequeninas e há que saber tirar partido.
    Agora, se formos a falar de mestria, outros nomes aparecem no Top of mind. ;)

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