A restauração nos Açores é um pouco como uma baleia morta que dá à costa.

No outro dia deparei-me com o interessante fato deste blog existir há mais de três anos. Façanha que confesso não me dizer muito. Não tenho um objetivo temporal ou a prazo. Da mesma forma que não me preocupo com grande precisão, seja ela sobre receitas, chef’s, restaurantes, aliás como se deve notar, escreva-se. Para mim, existem três grandes pilares de prazer sobre os quais este blog assenta: comer, beber e escrever. É com orgulho que vejo este rapaz, aos 3 anos, ser exatamente o espelho disso. Neste sentido, tarefa cumprida. Nestes 3 anos, este blog 100% açoriano, passeou-se pelos melhores restaurantes de cidades como Lisboa, Barcelona, Paris, Roma, Milão, Veneza, Florença, Berlim, Londres e Nova York. Muito provou, degustou, bebeu, tomou comprimidos de alcachofra por causa dos efeitos colaterais, e refletiu sobre a gastronomia em geral e muito em particular sobre a gastronomia açoriana. É com enorme tristeza, mágoa e pesar que vi e vejo a restauração açoriana a bater cada vez mais no fundo. Num mar de incertezas e total e completa ignorância entre o que distingue uma manjedoura de um restaurante. Se a incerteza, faz parte da condição humana, tal como a ignorância, a primeira é incomensuravelmente benigna perto da quase infinita natureza da segunda. Pelas minhas contas, e por alto, nestes 3 anos fecharam um a dois restaurantes interessantes e abriram uns 20 ou 30 muito maus. O perpetuar deste ciclo de infelicidade, promovido pela ignorância de ambas as partes, seja dos donos dos restaurantes, seja de quem lá vai é uma séria ameaça a uma espécie quase em vias de extinção na qual me incluo. Trocando por miúdos, a cultura do bife com as batatas fritas está a matar-me aos poucos. Os meios de comunicação mudaram, as redes sociais explodiram, aqui e ali vejo blogs e grupos que comentam e frequentam restaurantes micaelenses, fato que é suficientemente assustador, não para mudar de país, mas sim de planeta, quiçá de sistema solar. Comentários estes a quem um super-ego não assistiu, nem quando muito a vergonha cristã. São apenas e tão somente fruto da mais profunda ignorância. Sei que não é propositado quando alguém faz um comentário enaltecedor de um restaurante que não passa de uma grande merda, pois não é mais do que o resultado líquido da falta de conhecimento. Quem toda a vida comeu papas de sarrabulho, vai ficar contente com o quê? Com uma costeleta de cordeiro cozinhada a baixa temperatura? Quem toda a vida comeu chicharro frito, vai gostar de um ceviche de cavala? Quem toda a vida passou os seus jantares a chamar o empregado para vir à mesa habituar-se-á a ser servido sem ter sequer que mexer os olhos? Ou ficará incomodado? Não digo isto, com o rótulo da arrogância que sei que tão bem me assentará, quanto mais não seja por ser a resposta reflexo de quem se sentir atingido por estas palavras. Apenas o digo com a experiência de quem alimenta uma criança todos os dias. Se eu lhe der incessantemente bife com batatas fritas, ela comerá feliz da vida. Estarei eu comparar a nossa massa crítica de frequentadores de restaurantes com crianças de 4 anos? Não, de forma alguma. Por amor de Deus. A massa crítica de frequentadores de restaurantes é pior, pois já tiverem o tempo suficiente para atingirem o desenvolvimento cognitivo e abertura de espírito para perceberem ou tentarem compreender o que é isto da restauração à séria. Por isso, é que no Algarve e na Madeira existem restaurantes com recomendações e estrelas Michelin, e cá zero. A morte da nossa restauração é tão anunciada, que sei, por exemplo, que um bom restaurante da nossa praça tentou obter a distinção de recomendado pelo guia e obteve a seca resposta de: isso aí, não tem nada que nos interesse. Mas o mais fatual que posso apresentar ainda é este número assombroso: 12. 12 eram as pessoas que jantavam ontem à noite nas Portas do Mar. Não falo num restaurante, falo de 12 pessoas em todos. Numa capacidade instalada para servir umas 700 refeições por noite, serviu doze. Será porque os restaurantes das Portas do Mar são uma merda? Maneira geral, são do mediano para baixo. Mas forma geral está assim em todo o lado. A culpa é dos energúmenos que compõem a massa crítica de quem janta fora em São Miguel? Ou a culpa é dos energúmenos dos donos dos restaurantes, que não fazem a mínima ideia do que andam a fazer? Não sei. Sei apenas que a área de interceção destes dois grupos é um círculo que abrange ambos na totalidade. Por isso, em jeito de balanço 2012 apenas posso destacar alguns jantares do 10 Fest. E o resto é mais do mesmo, desculpem-me a franqueza. Por isso, da pimenta da terra vieste, para a pimenta da terra voltarás.

Comentários

  1. ehehehehehehehehehehheheehehheeheheheheheheheheheheheheheheheeheheheheheheheheheheeeheee... hein?

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  2. Ou como diria o Fernando Pessa: E esta hein? ehehehehehe ;)

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  3. 10 fast pago com o dinheiro de todos nós. Se pagasses o verdadeiro custo dessas iguarias se calhar nem tinhas papel para por lá os pés? E esta hein? ehehehehehe ;)

    Carlos Vaz

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  4. Meu Caro Carlos,
    Sobre dinheiro e finanças públicas pouco ou nada sei.
    Sei apenas, que já vi muito dinheiro, muito mal gasto que fazem parecer o que quer que se possa ter gasto no 10 Fest, uma verdadeira migalha. E tão saborosa ela foi, para todos aqueles que democraticamente decidiram ir lá ir jantar. Qualquer cidadão/contribuinte podia fazer a sua reserva.
    Sim, e garantidamente que se fosse mais caro, pelo menos a minha carteira não aguentaria. Sou tão teso como qualquer português médio neste país. ;)

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