McDonalds encerra em Puglia, Itália. Ou haveriam de ser só más notícias?

Quer dizer, chamar, à retirada estratégica do lado negro da força, de notícia quando isto aconteceu há mais de seis anos, é um exagero quase tão grande como chamar comida ao que o Ronald McDonald nos tenta vender. Porém, no outro dia ao ver um documentário sobre a gastronomia de Puglia, em que esta história era recordada, pensei que não é uma guerra ganha, uma batalha, nem sequer é um xeque ao Rei, é só mesmo uma história engraçada e carregada de moral. Recordo-me do título no Times: Padeiro derrota McDonalds. Juro que qualquer semelhança com nossa Aljubarrota é mera coincidência. Aliás, só pode mesmo ser coincidência, porque do pão da padeira mais famosa de Portugal ninguém fala, já o pão de Puglia, produzido a partir de uma receita com mais de 500 anos é reconhecido pela UE como um DOP, Denominação de Origem Protegida. O arqui-inimigo do Ronald McDonald chama-se Luigi Digesu, também conhecido como o padeiro de Puglia. Ele diz que a sua estratégia não foi bélica, muito pelo contrário, continuou a fazer o que sempre fez, uns belos panini com mortadela, scamorza, ovos, manjericão e tomate e também fedda, uma espécie de bruschetta. No início foi a novidade, tal como quando abriu o H3, mas não foram precisos muito mais do que dois anos para o gigante americano perceber que ali em Puglia não faria farinha. Conta-se que o McDonalds esteve para colocar um processo em tribunal quando o boneco do Ronald foi encontrado com um panini do Luigi, em vez do habitual Big Mac. Mas quando perceberam a media ridícula que isto lhes ia dar, voltaram a por o rabo entre as pernas e seguiram o seu caminho. A Itália é assim, um país que, ao contrário do nosso, não se deixa aculturar tão facilmente. Isto funciona e funcionou contra e a favor deles. Há uns quantos séculos atrás, Itália disputava com França, o título de cozinha com maior prestigio no mundo. Porém, o ultra conservadorismo Italiano, no que diz respeito à tradição na cozinha, entre outros factores, tais como ser uma manta de retalhos de país. Isto permitiu aos franceses, muito bem liderados por Antonin Carême, serem mais audazes, mais criativos, mais inovadores, sendo que até hoje gozam desse prestígio, embora nos últimos anos Adriàs, Redzepis, Hestons têm feito uns violentos assaltos a este Chateaux quase inderrubável. Para um italiano não é um orgulho, ou um prazer provar algo de novo, ou mesmo muito inovador. O orgulho vem de fazer um esparguete com molho de tomate como as suas tetra, tetra, tetra avó faziam. São heranças. São relíquias que não se podem perdem. A tua riqueza reside em fazer um molho de tomate com uma receita secreta de 1600 D.C. Curioso e irónico é também o fato do tomate ter sido descoberto na América, por um suposto italiano ao serviço de Espanha, e serem precisamente os italianos quem mais sabe tirar partido deste fruto. Tradição é um assunto muito sério em Itália, mais sério que religião ou futebol. Por isso, são o país onde melhor se come no mundo. Na perspectiva do frescura, sabor e saúde. Este mérito, ninguém lhes tira. Agora, será de fato castrador para evolução de uma língua gastronómica tanta resistência à mudança? É complicado responder. Não há tantos restaurantes experimentais, porque não vingam. Não há tantas estrelas Michelin, porque os italianos não as procuram. Mas também não há tanta porcaria disponível. Li algures que até o Starbucks tem medo de abrir em Itália. Por isso, até pode ser uma lógica castradora, mas quem mete Ronald’s, Wendy’s e companhia em sentido sem serem os italianos? Os carabinieri da alimentação saudável e tradicional. Como não a amar Puglia?

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