A importância de ser ignorante











Gostaria de começar este post pelo intestino. Esse órgão apaixonante. Como é óbvio toda esta parlação e comilança acaba de uma forma ou outra por passar no intestino. Mas a questão até é um pouco mais ao lado das funções intestinais, pese embora a labreguice, presente no que vou relatar e claro sempre presente neste blog, que se vos apresenta sob a forma de rebuçado salgado, seja apanágio deste país. Ou seja, no fim é de cócó que estamos a falar.
A Sociedade Portuguesa de Endoscopia Digestiva sentiu a necessidade de fazer uma campanha de comunicação. Creio que o objectivo seria o de alertar para a importância do rastreio no cancro do intestino. Até aqui, pão com manteiga.
A agência de comunicação, coagida ou não, decidiu que para aproximar as pessoas desta causa deveria criar uma mascote para o cancro do intestino. Então nasceu o Tino (Ver imagem no fim do post). O Tino é uma mascote com um ar de intestino grosso, ténia ou lombriga, venha o diabo e escolha o papel higiénico. E é pura e simplesmente a coisa mais labrega que vi nas últimas 24 horas. Sim, este país anda depressa. Tão depressa, que quando chegarmos ao fim deste post já teremos um motivo festa, regozijo e idiotice ainda maior.
Quem mandou fazer uma coisa dessas? Desconfio que o coordenador desta sociedade não o faria, porque o coordenador de uma sociedade com esta importância teria a inteligência de não cometer um erro destes. Desconfio que a agencia também não, uma vez que teria o brio de não o fazer.
Como qualquer ideia de merda, é bastarda, não deve ter pai, nem mãe. Bolas, nem amigos deve ter.
O Tino é uma mascote infeliz, condenada a acabar no hospital com o bucho cheio de comprimidos, porque simplesmente a sua existência não faz qualquer sentido.
Passada a indigestão inicial, tão comum para o leitor deste blog que já nem o deve incomodar, venha a verdadeira labreguice, porque meus amigos, aquilo que L.A.E acaba descrever é brincadeira de crianças ao pé de tudo o que já disse e ainda tem para dizer.
Até porque a minha opinião sobre o Tino vale o que vale, porque é a minha opinião. Porém, instintivamente, e repare-se que L.A.E tem um instinto muito apurado por andar na rua depois de escrever o que escreve, acredito que muito gente concordará comigo.
Mas esta democratização da opinião que nos foi trazida por Mark Zuckerberg, pelo inventor dos blogs e twitter e etc e tal trouxe às luzes da ribalta a profunda ignorância de um país falido económica e intelectualmente.
Como este blog versa sobre comida, e pelos vistos intestinos, decidi passar por algumas páginas que tenho descoberto por aqui e ali e que falam de comida, receitas, etc. Reparem que L.A.E não se deteve com uma investigação muito séria, sequer responsável. Facto que seria de uma enorme incoerência, diga-se. Vou apenas ilustrar a dita falência intelectual ó gastronómica com um exemplo que me faz as delícias.
Ora bem, aqui vamos. Desta página que dá pelo nome companhia dos Açores encontramos uma receita genial: Queijo fresco com pimenta.
http://www.companhiadosacores.pt/receitas.php
Pensarão os mais vivaços: interessante! Finalmente vou perceber como se faz queijo fresco. E vão perceber efectivamente, se encontrarem alguém que vos explique, porque para a Companhia dos Açores a receita é a seguinte:
Ingredientes: Queijo fresco de vaca – 1
Pimenta da Terra q.b.
Modo de confecção: Coloca-se o queijo fresco num prato e põe-se por cima quantidade que desejar de pimenta da terra.
Repare-se que se o queijo for de Cabra também funciona, mas não é a mesma coisa.
Para L.A.E isto é quase poesia. É arte. É um ovo de Colombo. Alguém, alguma vez, mesmo com os níveis de audácia no máximo, conseguiria fazer uma coisa destas?
Não. Mas garanto que esta é uma receita para trazer de volta para a cozinha os mais cépticos e optimistas.
Porém este é só um exemplo e sinceramente pretendo ficar por aqui, uma vez que vem por aí o Natal, e à velocidade com que as pessoas se ofendem neste Portugal dos pequeninos, prefiro passar uma santa ceia com os meus, em vez de a passar no hospital com todos os dedinhos das mãos partidos.
Mesmo assim, este exemplo ilustra, o que no entender de L.A.E é o lado negativo da democratização da opinião. O que vou escrever a seguir está no limiar do fascista, mas o que é que L.A.E é para além de um fascistazinho?
Para ter um blog sobre comida deveria ter que se passar por uma bateria de testes. Primeiro: saber quem tinha mais do que a quarta classe.
Só aí para mais de metade de blogs e perfis de Facebook sobre comida desapareciam. Já era uma ajuda.
O segundo ponto seria perceber sobre o que se escreve.
Vamos ver se L.A.E consegue com um exemplo idiota mostrar o seu raciocínio, provavelmente também ele idiota. Os Beatles escreveram e interpretaram o Get Back. Quando alguém toca o Get Back, mesmo que seja no Caldeira das Furnas, está a tocar ou a tentar tocar o Get Back.
Não está a tentar fazer lasanha à sua maneira. Ou Carbonara à sua moda. Está a cantar o Get Back dos Beatles.
Então porra, no que diz respeito ao receituário clássico, qual é dificuldade em o cumprir?
L.A.E não sabe, mas desconfia. Porque somos preguiçosos, burros e temos todos os outros burros a baralharem-nos ainda mais.
Explico.
Preguiça porque a maioria das pessoas é avessa a explorar e a investigar. Burros porque não há a certeza empírica que o conhecimento que se veicula na internet é muito dúbio. E mais uma vez preguiçosos e burros porque nos deixamos iludir pelos blogs escritos pela nossa mãezinha, que nos anda a enganar com receitas cheias de truques para cortar tempo e preparações, ou por todas as Julias e Julies do mundo que aderiram à onda trendy, criada pelos Jamies da vida, de que cozinhar e fazer dinner partys é uma coisa muito gira.
Vão-se lixar. Todos.
Jamie incluído, que é o primeiro a incentivar à malandragem. Vejo os programas dele é certo, mas também vejo o Beira Mar – Paços de Ferreira a contar para a nona jornada do campeonato nacional, e nenhum dos dois me fez cozinhar melhor no sentido clássico e técnico.
Aproveitando a analogia, tenho quer ler muito a Bola e o Record para falar de futebol com o mínimo de propriedade. Se não, não vale a pena discutir. Repare-se que quem percebe de futebol não tem o mínimo de tesão em falar com quem não percebe nada de futebol. A não ser que o interlocutor seja uma gaja muito boa. E mesmo assim, preferia falar da Novela da TVI do que do meu rico Benfica com uma analfabeta.
O contrário também é real. Quem nada percebe de futebol não tem gozo nenhum em falar com quem perceba de futebol. Já imaginaram a Bárbara Guimarães a ter uma conversa intelectual sobre futebol com o Luís Freitas Lobo ou o Gabriel Alves? O passe em profundidade, o sistema basculante, a pressão alta. Que seca dos demónios. Para os dois.
Quem é ignorante sobre um assunto não tem condições para um diálogo fluído sobre aquele tema, mesmo podendo trocar fluidos às custas de outros temas.
Amigos, a cozinha é a mesma coisa. Existem dois campeonatos. O dos ignorantes, em que ignorantes escrevem coisas sobre futebol ou cozinha para outros ignorantes. E são felizes. Vejo as receitas todas aldrabadas, como um à Brás que vi ser assassinado num blog no outro dia, e todos os outros ignorantes aplaudem: Uau! Delicioso! Tenho que experimentar!
Depois há o Larousse Gastronómico, mais três ou quatro livros clássicos e alguns mestres de matriz clássica como são o Joel Robuchon e o Gordon Ramsay. Depois temos 2 a 3 chef’s visionários como o Ferran Adrià e o René Redzepi.
É claro que os ignorantes que andam a ler e a postar nas minhas receitas (aldrabadas) ponto blogspot ponto come jamais vão entender o trabalho que dá para fazer uma receita clássica que seja complexa, porque estão habituados a aldrabar. Muito menos em dias de vida irão compreender um visionário como Adrià ou Redzepi, porque simplesmente não compreendem o que estes lhes dizem.
Curioso é verificar que estes dois visionários, ou mesmo Joel Robuchon também não teriam a mínima vontade de trocar receitas, truques ou dicas com a aldrabona da Nigela. Mesmo assim, creio que teriam a inteligência de lhe dar um bom amasso sem ter que usar sequer uma espátula de cozinha, quanto mais entrar na cozinha.
Resultado, cada um no seu galho. Adrià, Robuchon, Redzepi a cozinhar. O Jamie na televisão a dar show. Os ignorantes a verem o Jamie na Sic Mulher. (quantos mais o virem, melhor, pois quer dizer que não estão a publicar receitas idiotas na net).
Fica por resolver o caso da Nigela, que com o espírito de sacrifício L.A.E se oferece para a esconder no sótão lá de casa. Quanto mais longe da cozinha e mais perto do quarto de L.A.E, melhor.















O querido Tino dá-me vontade de fazer uma Endoscopia. Não sei explicar. É mais forte que L.A.E

Comentários

  1. graves erros de portugues serao perdoados12 de novembro de 2010 às 09:29

    Joel RObUchon... graves erros de frances serao eliminados ;-)

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  2. E para quandao teremos novos posts?

    Roh

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  3. pOR ONDE ANDARÁ O IMPORTANTES ESCRIBA DAS ARTES DO BEM COMER ???

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  4. Delicioso! Chamei a atenção no Gosto de bem comer mas com pena de me parecer isto ser o fim do luisanotonego. È que somos muito poucos a manter viva a chama do rigor e exigência na execrável blogosfera "culinário/gastronómica" portuguesa.

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